O Viaje Comigo foi o único site português de viagens convidado para ficar a conhecer in loco o projeto Italian Wonder Ways, que mostra os “Caminhos da Fé” no centro de Itália, e que se estendem até Roma. Calhou-nos fazer a Via Amerina, no também chamado de Cammino della Luce, datada do século III a.C. Durante uma semana percorremos os caminhos de S. Francisco (que ele tantas vezes fez até Roma) por entre campos, cenários rurais e vilas maravilhosas, tão pitorescas que se tornam encantadoras.
Uma das nossas sortes foi termos como companhia, durante esta jornada, Giancarlo Guerrini, profundo conhecedor do percurso e da história que o compõe, autor de um livro que documenta a par e passo o que poderá encontrar pelo caminho. Mas, não pense que só faz este caminho quem é religioso. Chamam-lhe o Caminho da Fé, mas há muito mais para conhecer e que o tornam interessante do ponto de vista turístico. Claramente terá um significado mais profundo para quem tiver ligação à Igreja Católica, seguir os passos de São Francisco de Assis… mas não é condição para embarcar nesta aventura.
Todos os dias fazíamos entre 11 a 15 quilómetros, pela manhã, e de tarde íamos conhecer as cidades e vilas por onde passávamos. Posso dizer que foi um programa puxadíssimo, não tanto pelos quilómetros que caminhávamos pela manhã (e do calor que apanhamos em finais de setembro), mas por todo o programa que existia depois e que exigia a nossa atenção, quando o corpo já estava muito maçado. Por isso, a minha sugestão é que alargue a sua viagem no número de dias (nós fizemos em seis) para que possa ir descansando.
O nosso caminho começou em Assis, com visita à Basílica, mas logo depois fomos para o hotel onde começaríamos a caminhada, no dia seguinte. A noite foi passada no Hotel Tenuta del Ciclamini, em Avigliano, assim como o jantar de boas-vindas. Fomos descansar e prepararmos-nos para o primeiro dia de caminhada.
Depois do pequeno-almoço partimos de novo com o mini-bus para Castel dell’Aquila de onde seguimos para o caminho até à bonita Amelia. Antes disso, visitamos o centro de interpretação da Floresta Fóssil de Dunarobba. Apesar de não termos tido tempo de ir até à floresta, ficamos a perceber o rico património natural que ali está, perto da cidade de Avigliano Umbro – que é o mais jovem município de Úmbria, região central da Itália – com troncos de árvores fossilizados com 1,2 milhões de anos.
Depois de arrancarmos na caminhada da Via Amerina, de Castel dell´Aquila até Amelia, recebemos a visita, durante alguns quilómetros da neta de Nelson Mandela, Ndileka Mandela, que é a cara e a madrinha do projeto Italian Wonder Ways a nível internacional.
O arranque oficial foi dado da Chiesa di San Giacomo e Anna, em Castel dell’Aquila, onde estão imagens de peregrinos importantes que por aqui andaram, como Santiago de Compostela, por exemplo. É qui também que está o mapa do Cammino della Luce que nos levará até Roma.
Apesar de existirem troços do caminho que passam pela atual estrada nacional – tenham muita atenção aos carros! – a maior parte do caminho é feita por meio de campos verdejantes. Aliás, não é por acaso que se diz que Úmbria é o coração verde de Itália. No horizonte temos sempre o Monte Soratte, com um comprimento de 5,5 quilómetros. O ponto mais alto fica a 691 metros acima do nível da água.
Antes de chegarmos ao centro de Amelia, paramos junto de um lago, num espaço ao ar livre da Associação dos Amigos do Rio Grande. Fomos até aqui escoltados por um grupo de cavaleiros que fazem parte de festa medieval que se realiza anualmente em Amelia. Os patos, os cisnes e até marmotas (!) banham-se e comem no rio, enquanto nós aproveitamos as mesas e bancos corridos, ao estilo piquenique, para provarmos as delícias locais.
Numa mesa, explicam-nos, estão os enchidos, os queijos, as pizzas e saladas de legumes tradicionais e que se comem nas casas de Úmbria. De Amelia estão representados os tradicionais doces com figos. Assemelham-se a umas bolachas recheadas com o fruto moído. Os medalhões de Amelia são um doce tradicional da terra, com receita passada de geração em geração. Depois do almoço, chegamos então à pitoresca vila de Amelia (conheça-a melhor no Viaje Comigo).
Depois de fazermos check in no hotel La Gabelletta fomos conhecer o centro histórico de Amelia.
Apesar de termos ficado neste hotel, e de ele ser muito giro, tenho de vos contar um episódio que manchou um pouco a nossa estadia… Isto porque se esqueceram que tinham de dar o pequeno-almoço ao nosso grupo na manhã seguinte! Ou, pelo menos, disseram-nos que o chef de cozinha se esqueceu… E não havia ninguém sequer a quem deixarmos as chaves dos quartos. No entanto, era um local muito bonito, com piscina e onde pode alugar apartamentos com dois quartos, cozinha e sala, etc.
Partimos então à descoberta de Amelia e começámos pelo topo do monte onde está a sua Sé Catedral (Duomo), passamos pelo teatro (pequeno e encantador), museu e pelas ruas do centro histórico, onde se descobrem ruínas da antiga via romana. As nossas boas-vindas são feitas com um espetáculo de um grupo de tambores e porta-bandeiras que fazem espetaculares coreografias com as mesmas.
Em Amelia e em Orte – e noutras vilas nas redondezas – as festas maiores incluem reconstituições históricas e, por isso, existem muitas tabernas que abrem nessas alturas, para dar a provar as iguarias locais e refeições com receitas da Idade Média.
De Amelia para Orte, tivemos mais de 10 quilómetros de caminhada. Porque estamos época (finais de setembro) em que os campos se prepararam para o cultivo, não há tanto verde em alguns locais, ainda assim os cenários são fantásticos e estas caminhadas são também uma boa forma de ficar a conhecer locais históricos (e verdadeiramente pitorescos) e, ao mesmo tempo, exercitar-se. Leve bastante água para o caminho!
A estrada da Via Amerina é histórica. Por aqui passaram, há muitos séculos, todos os que iam para Roma, incluindo os imperadores romanos. Pelo caminho vamos encontrando trechos das estradas romanas (com enormes pedras, desgastadas pelas rodas das antigas carruagens) e também casas que serviam de pontos de paragem (ao estilo de estalagem) onde podiam dar de beber aos cavalos, para comer e até pernoitar. Alguns dos locais desapareceram, porque muitas casas foram construídas por cima de antigas casas e estradas romanas, usando inclusivamente as suas ancestrais pedras.
No geral, o caminho é bem identificado com as setas que indicam as várias povoações e o números com os quilómetros que faltam. E também não tem enormes subidas ou descidas – só algumas. Ou seja, não precisa obrigatoriamente de estar na máxima forma para o fazer. Eu fiz e não estava nada em forma! Tinha o cuidado de, no final do dia, fazer alongamentos, tomar banhos para relaxar músculos e sempre calçar dois pares de meias com sapatilhas, para não ganhar bolhas. Consegui chegar sã e salva ao final.
Antes de chegar a Orte (e aí sim, vai ter uma enorme subida a pique, para chegar ao topo do monte onde está o centro histórico), vai encontrar as ruínas romanas do antigo porto romano fluvial, do século II a.C. (Seripola), onde pode ver casas e locais onde se guardavam as embarcações.
Depois de tanta caminhada, subimos a pique a derradeira rampa para Orte e para o almoço. Mais umas dezenas de degraus que, depois de 11 km de caminhada, custam mais do que seria normal. Mas chegamos!
Figurantes com roupas medievais esperam-nos para sermos recebidos como se estivéssemos a passar por lá durante as festas de Orte. Ali mesmo, debaixo dos arcos antigos desta cidade de Lazio (sim, saímos da comuna de Úmbria e estamos agora em Lazio) está a taberna, de paredes de pedra e ambiente medieval. Os talheres são de madeira e a comida é, mais uma vez, a típica da terra. Se puderem passar por lá e provem as delícias como o “mil folhas de batata presunto, verdes e queijo derretido”. Uma delícia!
Dentro da visita ao centro histórico de Orte – onde também fomos recebidos por mais uma banda e porta-bandeiras, mas desta vez unicamente com crianças – há uma cidade debaixo dos nossos pés para descobrir. O Orte Underground mostra toda a cidade que existia, há muitos séculos, debaixo da atual cidade.
Em Gallese, paramos para descobrir a Basílica de Saint Famiano e visitamos o túmulo do Santo peregrino. Alemão de nacionalidade mas que dedicou a sua vida a esta região. Foi apenas uma breve paragem para depois seguirmos para a bonita Civita Castellana, onde vamos passar a noite.
A estadia em Civita Castellana foi no hotel de 4 estrelas Relais Falisco e o jantar no seu restaurante (bom!) La Scuderia.
No dia seguinte poderá ter duas opções. Seguir a Via Amerina de Morticelli (Vasanello) até Corchiano (15 Km) e fazer visitas à necrópole de Morticelli e ao centro de Vasanello, conhecer o monumento natural de Pina Sant’Angelo e ficar a conhecer Corchiano, Faleria e Calcata. É um dia completo com muitas atividades, mas se preferir fazer uma pausa na caminhada – e prosseguir um dia depois – e ficar por Civita Castellana.
Ficamos em Civita Castellana, num domingo soalheiro. Durante o dia fomos a uma pizzaria almoçar e, à noite, fomos a um ótimo restaurante: o Becco Fino. É incrível a vida desta pequena vila da região de Lazio – província de Viterbo – com pouco mais de 15 mil habitantes. À noite, num dia da semana, estava em festa com recriações medievais, junto do forte, e à noite havia um concerto ao ar livre, com centenas a passearem pelas ruas.
Temos então de nos deitar, pois a Via Amerina espera por nós novamente. Manhã cedo metemos de novo os pés ao caminho. O mini-bus levamos a um ponto de partida do caminho e fazemos de Falerii Novi, pela Via Pianella até Nepi (cerca de 12 Km).
Começamos, aliás, a amanhã na Chiesa di S. Maria in Falleri e nas ruínas romanas e troço da Via Amerina que estão nas suas traseiras. A estrada de Falerii Novi é, sem dúvida, uma riqueza histórica, com estradas romanas ainda em perfeito estado durante vários metros – ladeadas de necrópoles.
Ficamos depois a conhecer a Basílica e Santuário de Castel Sant’Eli, antes da caminhada. Ao almoço, paramos também para visitarmos Nepi, principalmente dedicando tempo ao Castelo dos Bórgia (Castelo de Nepi) – tem por detrás do castelo o restaurante Casa Tuscia, onde se come muito bem – e às catacumbas de Santa Savinilla.
Estes são dois importantes pontos históricos de Nepi. Daqui fazemos o transfer para Roma onde nos vamos juntar a todos os outros peregrinos que fazem os caminhos do Italian Wonder Ways. Como sabem, todos os caminhos vêm dar a Roma!
A primeira noite é passada no Hotel Villa Maria Regina e o jantar é no Casali del Pino (uma fazenda agrícola biológica, com comida excelente), já com todos os outros peregrinos que fizeram os outros cinco caminhos até Roma.
E já que estamos perto de Roma (o hotel não está mesmo no centro da cidade), na manhã seguinte vamos todos fazer os últimos quilómetros juntos e conhecer o pulmão verde de Roma: a Reserva Natural “Insugherata”, com caminhada no Monte Mario (cerca de 10 km) até chegarmos a uma típica rua romana.
Nessa rua, junto à Igreja de S. Lazaro (San Lazzaro ai lebbrosi) estava montada uma mesa gigante com comida para nos receber! A nós, peregrinos do Italian Wonder Ways! E a mim foi-me pedido para falar com o pároco desta igreja, pois o mesmo estava a estudar português e queria praticar! Muito simpático! 😀 Também aqui, naquela igreja, pudemos assistir a uma recriação medieval com música e figurantes e a um concerto medieval.
Como éramos mais de 100 pessoas (entre participantes e organização) não foi fácil arranjar um local que nos pudesse receber a todos para pernoitar. Por isso, na segunda noite em Roma, ficamos a 20 Km do centro da cidade, num sítio lindíssimo que é a Villa Tuscolana, com vista para montes e para a cidade ao longe.
Aqui tivemos a honra e o privilégio de ter um jantar de despedida, e de gala, com todos os envolvidos no projeto Italian Wonder Ways.
No dia seguinte, a peregrinação terminou com a nossa entrada na praça de São Pedro, no Vaticano, onde pudemos assistir à missa do Papa Francisco, para milhares de pessoas que estavam no local. E onde estavam também muitos outros peregrinos vindos de todos os cantos do mundo. Foi um final de caminhada bonito e o projeto Italian Wonder Ways mostrou que qualquer pessoa pode fazer à sua maneira o caminho.
Se não se sentir à vontade para caminhar tanto, faça-o com transferes entre os troços do caminho, como nós, com estadias mais prolongadas nas vilas por onde passa e com mais tempo para descansar. Só assim poderá aproveitar ao máximo este Cammino della Luce. Para o Viaje Comigo foi um privilégio estar entre os cerca de 70 jornalistas e bloggers, de todo o mundo, escolhidos para fazer estes caminhos e esta experiência. Boas viagens!
O Viaje Comigo agradece o convite para esta viagem e a todas as pessoas do projeto Italian Wonder Ways e do Consorcio Francescos Ways, que trabalharam arduamente para que fosse possível desfrutarmos desta experiência.